quinta-feira, novembro 23

31-2006:O TGV da Beira Baixa


Toulões é uma pequena aldeia que, tal como as suas congéneres da raia perdida, ficou irremediavelmente esquecida nos confins da interioridade, no limiar que une (ou que separa) as duas nações que, dormindo juntas no leito ibérico, quantas vezes acordam de costas voltadas.
"No limiar do iberismo pensam alguns".
Efectivamente, há quem já nos considere espanhóis, o que, em parte, é uma meia verdade.
Durante muitos anos, dizia-se a mangar, era bem mais fácil chegar a Madrid do que a Lisboa. Até à entrada de Portugal na CEE e antes da construção das IPs 2 e 6, (agora A23, por enquanto SCUT sem custos para o utilizador) demorava-se quase metade do tempo a fazer o percurso até Madrid (370 Km) do que até Lisboa (310 Km).
O bom entendimento com "los pueblos" fronteiriços dura há séculos. Apesar das históricas escaramuças entre os dois países que remontam ao início da portugalidade, este relacionamento manteve-se e cimentou-se ainda mais durante a guerra civil espanhola, quando muitos de "nuestros hermanos", fugindo a uma morte que ceifava o povo a eito, procuraram acolhimento do lado português.
O contrabando de géneros de um lado para o outro da fronteira, também permitiu um maior estreitamento entre as duas margens do Erges, num tempo em que o escudo batia facilmente a peseta no braço de ferro do câmbio, devido à fraca economia de além ribeira. A peseta, a rondar os 4 ou 5 tostões, proporcionava grandes vantagens na aquisição de produtos espanhóis, mas com a contrariedade de ficarem sempre sujeitos a ser apreendidos pela Guarda Fiscal.
Num ápice, a economia espanhola fortaleceu a peseta. Então, invertendo a tendência cambial, deixou de ser compensador ir a Espanha fazer compras, passando o comércio das nossas cidades fronteiriças a atrair os nossos vizinhos, apesar de continuarem a ser acerrimamente defensores daquilo que é deles.
Agora, com a livre circulação no espaço europeu, com a entrada em vigor da moeda única (nessa altura já a peseta valia 15 tostões) e com a crescente pujança da economia espanhola, vai-se naturalmente a Espanha abastecer de combustível, encomendar materiais de construção, mudar as lentes aos óculos e tanta coisa, com grande vantagem para a magra bolsa dos raianos.
Às vezes, deveras que bem nos apetecia ser espanhóis.
E ainda mais!
Com a implementação do TGV e a inicialmente prevista ligação por Cáceres, a entrar em Portugal aqui por perto, a distância até Madrid encurtar-se-ia significativamente.
Mas..., está decidido, está decidido. O TGV vai mesmo passar por Badajoz.
Segundo se diz por aí: "esta opção é a melhor para todos os lisboetas, enquanto que a entrada por Cáceres seria boa apenas para os portugueses".
Enfim, como as aleatórias decisões políticas dos governantes são mais dogmáticas que os postulados do Zé-Povinho, somos constantemente forçados a carregar com o nosso inconformismo.
Às vezes, em conversas sérias, brincando com o assunto, tivemos a imaginária esperança de que a passagem do TGV aqui por perto, seria uma mais valia para toda esta região.
Com algum privilégio, Toulões até teria um apeadeiro que serviria também o aeródromo de Termas de Monfortinho, a escassos quilómetros, que, desde a abertura da reserva de caça turística do Espírito Santo, aumentou de tal forma o tráfego aéreo que já se pensou em acrescentar a pista que iria, na sua reinauguração, receber o Airbus A380 no seu primeiro voo comercial (Ricardo Salgado como interessado e Sousa Cintra como utilizador já deram o seu aval).
Com esta obra a avançar em detrimento da da Ota, poupar-se-iam uns milhões que serviriam para melhorar a estrada que liga Toulões-Torre-Monfortinho e que há meia dúzia de anos tirou os já poucos habitantes do Carriçal de um soturno isolamento.
Esta estrada, com ligação a Espanha, ramificaria pelos concelhos vizinhos, sendo uma linha nevrálgica na estratégia para desenvolver toda a zona raiana.
Criavam-se incentivos não fictícios para uma nova agricultura biológica, já que é a actividade para a qual estamos naturalmente vocacionados.
Renovavam-se e ampliavam-se os canais de regadio da campina; retomava-se a produção de azeite mediante o renovo dos olivais, assim como o restauro dos lagares ou a construção de novos; adquiria-se maquinaria para encher os campos com grandes cearas (esquecendo os trangénicos) limpando o mato atreito a incêndios; curava-se e renovava-se o montado de sobro e azinho, tal como a criação de novos pólos veterinários para ajuda à exploração pecuária, nomeadamente o porco preto que tanto gosta de se alimentar, vagueando de azinheiro em azinheiro enchendo o corpinho de bolota e outros mais que fariam renascer aqui uma vida nova, um pouco à imagem do que se fez do lado espanhol com os subsídios da CEE.
Para aquisição de mercedes, jeeps e outros veículos de trabalho a custos bonificados, os interessados teriam, tão só, de comprovar a rentabilização do investimento feito com o incentivo de que beneficiaram, prova essa que serviria também para ganhar o direito a futuros incentivos.
Este sonho poria certamente Toulões e toda esta região, no mapa do desenvolvimento.
Estou já mesmo a imaginar as televisões a acotovelarem-se para entrevistar o Zé Torres, nosso digníssimo presidente da junta, sobre projectos futuros para a fixação de pessoas e a reabertura das escolas primárias para que incutam às crianças o orgulho de ter nascido aqui.
Voltaria o burburinho da canalha no recreio que em alegres cantigas de roda trauteava agora: "O TGV da Beira Baixa / Tem vinte e quatro janelas / Mais abaixo, mais … (vocês sabem o resto)".
A ser real este feito, a sua notícia relegaria para segundo plano uma grande reportagem jornalística sobre um acontecimento que fez aqui concentrar todas as atenções, mas que passados dois dias não passava de uma longínqua efeméride.
Essa notícia, no último dia de Novembro de 2002, (não sei se ainda há quem se lembre) foi precisamente sobre o Carriçal (Carcel como dizem os mais velhos).
Neste pequeno aglomerado pertencente à freguesia, a cerca de 5 Km, onde, com pompa e circunstância, se inaugurou a luz eléctrica que, tardiamente, veio trazer alguma qualidade de vida às gentes desta terra, que nem aldeia é, onde o passado está bem presente, mas em que para o presente, mesmo com a recente chegada da luz, não se vislumbram réstias de futuro.
Este acontecimento, raro nos dias que correm, foi celebrado com festa da rija pela numerosa comitiva de convidados da autarquia que se deslocaram a este lugar, longe de tudo, e pela população residente, para assistir ao "dar ó botão" no Carriçal.
"Afectível, afectível, só cá moram três pessoas, mas o tempo da zêtona ajunta cá mai gente…agora stamos cá… (pausa para pensar) …cinco!", respondia desoladamente a ti Moreira Felisbela, do cume dos seus 80 anos, ao jornalista da TSF João Morais (que merecia um prémio pela excelência da reportagem que aqui fez (Na penumbra) e pelo seu profissionalismo na arte que tem de reportar sobre assuntos da ruralidade).
O presidente da Câmara de Idanha-a-Nova, Álvaro Rocha, também inquirido a pronunciar-se sobre esta obra, começando naturalmente por refutar a possível ideia de eleitoralismo inerente ao evento e salientando que os três votos destas pessoas nem sequer fizeram a diferença para os seis que lhe deram a vitória (no mandato anterior), respondeu em tom de confidência:
- Sabe que, às vezes, com os desperdícios dos investimentos de obras maiores, fazem-se estes pequenos milagres!
Esta deixa leva-nos a perguntar: onde, depois de concluídas estas obras faraónicas, TGV / Ota, irão ser aplicados os desperdícios do esbanjamento?

terça-feira, novembro 21

30-2006: Meio desafio aceite


Após alguns dias de ausência inesperada, estou de regresso a este convívio virtual.
Foi com alguma surpresa que me deparei com um desafio proposto, quase em simultâneo, por dois companheiros de lide:
O Joaquim (Por terras do rei Wamba) e o Jorge (O sino da aldeia).
Aceito com satisfação o desafio, mas apenas pela metade. Vou revelar as cinco manias, mas, no que toca a desafiar mais cinco é difícil, dado que durante este tempo de ausência gorou-se a oportunidade, visto que praticamente todos os que costumo visitar já foram desafiados.
Como dizia um famoso fadista do antigamente: "com letra minha e música do meu pai... ENTÃO AQUI VAI."
1 – Tenho a mania que não tenho mania nenhuma, mas algumas pessoas apontam-me as que se seguem:
2 – Que tenho a mania de dizer sempre que sou de onde sou, enquanto outros dizem que são da Beira, de Castelo Branco ou, vá lá, de Idanha-a-Nova.
Quando me ouvem dizer que sou "dos Toulões" percebem "estou longe" e consecutivamente vem logo a pergunta: "estás longe?" Eu respondo sempre da mesma maneira: "estou, mas é como se lá estivesse".
3 – Que tenho a mania de que não há melhor fruta que o diospiro e que os figos inverniços eram melhores se viessem antes dos temporões.
4 – Que tenho a mania dos sapatos de camurça porque não é preciso dar-lhes graxa. (aqui digo-lhes que: brilho?, só quanto baste)
5 – Que tomar café sem açúcar é tomar uma atitude drástica.
UM ABRAÇO A TODOS!