quinta-feira, janeiro 31

4-2008: Dá que pensar!


Um estudo elaborado pelo Observatório para o Desenvolvimento Económico e Social da Universidade da Beira Interior, surgido há dias na imprensa, estabelece o ranking de todos os concelhos do país, avaliando-os pelo IQV (Índice de Qualidade de Vida) de cada um deles.
Esta avaliação é baseada em múltiplos factores como sejam: a educação e mercado de emprego, as infra-estruturas, o ambiente económico e habitacional, o nível de criminalidade, a intensidade de tráfego e muitos outros, que englobam diversos aspectos ligados à satisfação das necessidades humanas básicas.

Dessa extensa lista de 278 concelhos classificados por IQV, nos 20 lugares com mais baixo índice, 7 pertencem à Beira Interior.
Um
é no distrito de Coimbra
275º - Pampilhosa da Serra - 13,69
Dois
são no distrito de Castelo Branco

262º- Idanha-a-Nova - 30,16,
270º - Penamacor - 21,89,
Quatro
no distrito da Guarda

260º - Figueira de Castelo Rodrigo - 31,71,
268º - Vila Nova de Foz Côa - 25,09,
273º - Aguiar da Beira - 14,97,
278º - Sabugal - 5,29 (último da lista)
- - - x x x x x - - -

Quando os leigos na matéria, como é o meu caso, concebem como conceito de boa qualidade de vida nas pequenas povoações, o privilégio de usufruir de um ambiente calmo, sem "stress", de contactar directamente com a natureza, fazer uma alimentação saudável com produtos biológicos, ter infra-estruturas mínimas de saúde e lazer, fica-se a saber que a qualidade de vida nas aldeias está cheia de imponderáveis.
Lembrando o vento da desertificação que há anos assola esta região, e levou para outras paragens os filhos por aqui nascidos e por aqui criados, sabe-se lá com que dificuldades, foi para muitos o vento da mudança. Esse mesmo vento devolveu às origens alguns menos resistentes ao sopro de saudade, para aqui passarem o resto dos seus dias, usufruindo de algum bem-estar conseguido subindo a pulso a corda da vida.

Agora, dizem eles, regressaram à aldeia para gozar de uma melhor qualidade de vida.
Será que têm razão?
Nota:

Da referida lista, os primeiros 10 lugares são ocupados, por esta ordem, pelas seguintes localidades:

1º - Lisboa - 205,07
2º - Albufeira - 181,04
3º - São João da Madeira - 168,57
4º - Porto - 161,05
5º - Sintra - 158,73
6º - Lagos - 158,51
7º - Cascais - 148,57
8º - Lagoa - 143,95
9º - Vila Franca de Xira - 142,82.
10º - Aveiro 142,81

Fonte: Jornal do Fundão (edição impressa)

terça-feira, janeiro 22

3-2008: Puro Raiano

Folha do tabaco na fase de secagem em estufa
- Coito das Areias (Zebreira / Idanha-a-Nova) -


Com a entrada em vigor da nova Lei do Tabaco, a ASAE virou definitivamente a marca da moda.
A sua, cada vez maior, visibilidade é ganha pelo protagonismo assumido em fazer a todo o custo cumprir a dita lei que, tal como outras anteriores, parece ter sido apressadamente despachada para fugir à ameaça de tsunami, provocada pelas ondas de choque originadas pela descarga da concentração aerofágica, acumulada por um grande da Europa incessantemente forçado a um doloroso deglutir em seco, engasgado com a instabilidade bolsista.
Naturalmente, quando as calamidades acontecem, é sempre o mexilhão que sofre piores danos colaterais, mas, com a ASAE vigilante, aparece sempre no momento oportuno uma mão amiga para dar uma palmada de reconforto, vincando a sua marca com o rigoroso cumprimento da lei.
Veja-se o que tem vindo a acontecer por toda esta Raia com os produtos regionais: enchidos, queijos, vinhos, azeite, doces e toda uma panóplia de sabores e saberes tradicionais cobertos pela poeira da história, que agora é preciso limpar em nome da modernização. Até a matança do porco, símbolo da união entre familiares e vizinhos, exemplo do espírito de entreajuda, está já amarrada ao banco para ser sentenciada.
Todas estas actividades já estão etiquetadas com a marca da ASAE, inclusivamente alguns cafés de aldeia já têm também a publicidade selada na porta, sinal da sua implacável intervenção.
Depois de provado que FUMAR MATA, pois claro, proíbe-se o fumeiro.
Agora chegou a vez do tabaco. Sempre pensei que a fiscalização fosse incidir sobre o contrabando, mas não: foi sobre o consumo e o consumidor, para desgraça dos agricultores idanhenses.A ameaça já pairava no ar desde 2005, quando a EU impôs o corte nos apoios ao cultivo do tabaco em Portugal. A sua produção, que se previa poder chegar até 2010, foi subitamente abandonada no ano passado e, claro está, a campina de Idanha-a-Nova, da qual saíam cerca de 65% da produção nacional na variedade Virgínia, ressentiu-se disso ao ser abrangida por esta medida.
Este abandono trouxe graves implicações sociais à vida agrícola por, no imediato, não ter sido dada alternativa (tudo aponta para a produção de bio-combustíveis, mas pelos vistos os estudos/projectos de viabilidade estão em combustão lenta) o que provoca revolta dos pequenos produtores que ficam de braços cruzados a verem o tabaco consumido, a ser importado.
"Pelo menos, mesmo que inconscientemente acontecesse, já não nos podem culpar da morte prematura de tantos portugueses" – dizem.
O abandono do cultivo do tabaco não implica o automático abandono do vício (ou do prazer) de fumar. Aproveitando a produção que ainda resiste, sem subsídios, e aproveitando a grande reputação de que goza a marca ASAE por todo o país, a ARBI (Associação de Regantes e Beneficiários de Idanha) e a APT (Associação dos Produtores de Tabaco) bem poderiam encetar negociações com o principal representante desta reputada marca (grande apreciador de cigarrilhas), propondo uma parceria para a instalação na campina de Idanha de uma unidade de produção de cigarrilhas e charutos, capaz de competir com as mais famosas marcas cubanas.
Num estudo de mercado elaborado após a promulgação de Lei do Tabaco, concluiu-se que esta forma de apresentação das folhas da planta Nicotina Tabacum, é a que mais probabilidades tem para singrar junto da restrita camada de consumidores, frequentadores dos locais contemplados na excepção à Lei que se adivinha estar para breve.
De futuro, se alguém se abeirar de si e lhe oferecer uma flor de tabaco, ouvirá certamente:
- Vai um puro Raiano ... um ASAE?

quinta-feira, janeiro 17

2-2008: Poema Toulonense a um ex-fumador

Foto de autor desconhecido

Poema para um ex-fumador inveterado
Eu fumo
Tu fumas
Ele fuma
Nós fumos
Vós fostans
Eles fôra-ne

quarta-feira, janeiro 2

1-2008: Tratado novo, vida nova

Aldeia fronteiriça de SEGURA (Idanha-a-Nova), vista da ponte internacional sobre o rio Erges. No Império Romano, esta ponte estava inserida na estrada que servia de ligação entre Mérida e Braga.
O ano de 2007 acabou como acabou!
Bem ou mal, só o tempo dirá se o Tratado Europeu, nascido em Lisboa, nos trouxe benefícios assinaláveis ou se, como de costume, graças à habilidade portuguesa em negociar, nos temos de contentar com promessas de prosperidade para o futuro.
Mas isso fica para depois!
O que interessa agora é que, feito o registo de nascimento do Tratado Reformador, Portugal no exercício da presidência da EU batalhou para que o seu baptizado fosse celebrado em simultâneo, conseguindo-o in extremis.
Numa pomposa cerimónia (chamaram-lhe cimeira), com a presença de toda a família europeísta a testemunhar o acto, foi-lhe então atribuída a graça da nossa bela cidade de Lisbonne, capital de "ce petit pays" plantado na extrema ocidental do velho continente. Esta peculiaridade, considerada pelo poeta a fronteira onde a terra acaba e o mar começa, deixa nos europeus menos conhecedores da nossa história (e nada interessados nela), a convicção de que nem somos carne nem somos peixe.
Para estes, o local de onde saíram homens destemidos, que se aventuraram por mares nunca dantes navegados, em viagens que à escala da época corresponderiam às viagens espaciais de hoje, trazendo notícias do achamento de novos mundos que tornaram Portugal maior, não passa de um pequeno país de emigrantes e pescadores de bacalhau, marinheiros que nunca meteram calado a romper por águas para além da Trafaria.
Este esforço, feito para que tudo corresse de feição, viu-se recompensado. Portugal foi colocado na prateleira da história da EU, pelo feito de ter conseguido reunir 27 países pertencentes à família europeia em redor de um projecto comum: o tradicional retrato de família.
É, em sentido lato, aquilo a que podemos chamar: trabalhar para o boneco.
São momentos como este, descurando a divulgação do documento às populações, a única parte que importa registar.
Para assinalar o evento, foi oferecido a cada um dos membros mais chegados desta grande família uma caneta em prata de lei, para assinar, e legitimar, uma reforma que garante a nossa incapacidade reivindicativa e a consequente precariedade da nossa economia, assim como o corte nos investimentos em projectos para desenvolvimento das zonas mais desfavorecidas do nosso Interior, em detrimento de países menos necessitados ou menos periféricos e com menos capacidade negocial que a portuguesa.
Também, pela nossa reconhecida hospitalidade, e por ser Natal, foi oferecido a cada um de nós um alicate obliterador dourado, para fazer mais um furo no cinto de cada vez que formos chamados a realizar um esforço suplementar e, assim, poder aguentar a carestia de vida.
E a generosidade não acabou por aqui!
Com a decisão de ratificar parlamentarmente o documento, fomos poupados à enfadonha tarefa de ter de nos pronunciar sobre o assunto. Efectivamente, essa coisa de ter de ir às urnas, a um domingo, ainda por cima sempre na incerteza em saber de que lado está o gume do voto, que deixa em nós a frustrante sensação de, consecutivamente, ficarmos entalados entre o voto e a parede, é uma chatice.

- Tratado novo, vida nova. O baptizado foi giro, pá. ?
- "Porreiro, pá!, o Tratado de Lisboa ficará na História por abrir novos caminhos no ideal europeu!" 
O pior é que, terminado o fogo de artifício e apagadas a luzes -"calabaça, calabaça, cada qual p´ra sua casa" - Portugal ficou de novo sozinho em Lisboa, entregue a si próprio, a limpar os restos da festa e a arrumar a casa.
Aos Raianos, resta-nos a consolação de a Europa ser aqui ao lado. Facilmente podemos lá ir comprar, por bom dinheiro, os sonhos daqui levados por umas cascas de alhos.
Basta tão só arregaçar as calças e atravessar a Ribeira Espanhola (Rio Erges), com a vantagem de nem sequer ser preciso passar a salto, como fizeram muitos dos que de cá partiram à sua conquista em finais da década de 50.

Com o 1º post deste ano quero desejar a todos um BOM ANO 2008