domingo, janeiro 31

3-2010. As Janeiras (2)

O "cantar das janeiras" em Toulões, nos últimos anos trazido prá rua por um empenhado e animado grupo de conterrâneos, de modo a confraternizar e fazer a festa, dando um safanão na letargia que teima em se querer instalar no quotidiano das aldeias raianas, é visto como uma forma deste povo, cujo futuro se considera ultrapassado, viver o presente com um novo vigor.
Apesar do entusiasmo patente no semblante dos mais velhos, que usufruem sofregamente destes pedaços de memória viva, consta não terem sido as janeiras um costume muito enraizado no tradicionalismo Toulonense, contrariamente ao que acontecia noutras terras do concelho. Pelo menos, do que se conta do tempo em ainda havia gente que se visse nas aldeias, não há alembrança de alguma vez se ter assistido ao evento da forma organizada como agora se proporciona, embora os procedimentos, um pouco mais encenados, sejam aparentemente os mesmos.
Em tempos idos as janeiras eram cantadas por um restrito número de grupos, compostos por duas ou três pessoas membros de famílias necessitadas, à porta das casas mais remediadas.
Este costume tinha aqui muito pouca expressão e foi tendencialmente desaparecendo, um pouco absorvido pelo de "pedir os tchouriços" na Segunda-Feira-Gorda (é que, enquanto se cantavam as janeiras, já esta tradição maior assomava ao postigo da entrada do mês de Fevereiro) era encarado por muita gente como um disfarçado acto de mendicidade e, só por essa razão, correspondido caritativamente graças à religiosidade que emparelha o seu lado solidário.
Apesar da boa vontade, poucos chouriços se davam às janeiras. Davam-se, isso sim, enchidos menos nobres como eram os batateiros, as farinheiras ou as morcelas, que duas ou três semanas depois da matança já tinham ajudado a lamber os dedos.
Levassem as janeiras uns butchanos ou umas mouras, já era um "viva o velho". É que os chouriços, esses, alguns feitos a preceito pelas moças namoradeiras e de reserva a uma ponta da vara do fumeiro para serem dados a um rapaz do partido, que nas vésperas de Entrudo lhe viesse cantar à porta:

Deus abençoe esta casa
Onde à noite nasce a Lua
Quando a dona vem à porta
Alumia toda a rua

Hoje já não é bem assim.

Canta-se, mas já não se dão chouriços, nem morcelas, nem nada que ao porco tenha pertencido porque já poucos matam.

Os convivas, recebidos à porta ou convidados a entrar, são agora mimoseados com doces, caseiros ou não, bebidas finas e vão-se embora a arruler.
Às janeiras, cantadas depois do sol-por durante o mês de Janeiro até se dar a volta à aldeia, dá-se dinheiro, dinheiro esse que é depois aplicado a favor da comunidade numa grande almoçarada, realizada Domingo Gordo, no "salão", para quem quiser aparecer.

7 comentários:

eddy disse...

chanesco (armando), haja luz!!! fico contente por este retomar. esta temática relacionada com estas dádivas merecia um trabalho. fica a proposta.

um abraço

a d´almeida nunes disse...

Bons velhos tempos!

Pelo menos, nostálgicos e sentidos!

Um grande abraço, Chanesco

António

Helena Teixeira disse...

Assim é que é,toca a animar a aldeia :) Esse texto teria sido um must na blogagem de Janeiro da Aldeia.

Aproveito e deixo um convite: participe na Blogagem de Fevereiro do blogue www.aldeiadaminhavida.blogspot.com.O tema é: “O Carnaval e as suas Tradições”. Basta enviar um texto máximo 25 linhas e 1 foto para aminhaldeia@sapo.pt (+ título e link do respectivo blog) até dia 8 de Fevereiro. Participe. Haverá boa convivência e prémios (veja mais no blog da Aldeia)!

Abraço
Lena

MPS disse...

Caro Chanesco

Sou eu que fico a "arruler" depois de saborear os seus escritos.

Se as janeiras eram identificadas com a mendicidade, é bom sinal que tenham pouca tradição em Toulões!

Um grande abraço

Helena Teixeira disse...

Olá!
Obrigado pela visita ao blog da Aldeia.Disponha sempre :)

Jocas gordas
Lena

karraio disse...

Só hoje é qu'arreparei na tua volta. Passei por cá algumas vezes a pedir tchouriço...

horticasa disse...

Boa!..
Não percam nunca as tradições.
Na minha terra perdeu-se tudo e quando eu falo nas coisas antigas até parece que têm vergonha e aínda me gozam...
um abraço
eugenia